A VIDA COMO ARTE
- Roger Walter
- 26 de jun. de 2018
- 6 min de leitura
Atualizado: 27 de jun. de 2018
PARADA LGBTQ+
Em 2017 a Parada do Orgulho Lgbt de São Paulo levou cerca 3 milhões de pessoas para as ruas, número estratosférico para uma minoria, no país que mais mata LGBTQ+ no mundo. A parada teria movimentado R$ 2,4 milhões por dia, o dobro do que o governo investe na infraestrutura do evento. E no mesmo ano um levantamento feito pelo Grupo Gay da Bahia mostrou recorde em mortes de pessoas LGBTQ+, foram 445 mortes no total, uma vítima a cada 19 horas. Esse levantamento começou a ser efetuado pela ong há mais de 30 anos.
Os dados são entristecedores e estão, infelizmente, aumentando conforme os anos. Mas apesar de todas as dificuldades e homofobia inserida no país, atualmente o cenário musical está em desenvolvimento satisfatório para o público LGBTQ+. Isso pode ser observado com o crescente número de artistas que vem fazendo diferença dentro das plataformas digitais, televisão e público. Dizem que Pabllo Vittar foi um abre alas para que essa nova geração dentro da música brasileira pudesse surgir sem medo e enfrentando principalmente o preconceito, levando em paralelo, a diversão e o amor. Conheci e conversei com duas Drag Queens que estão fazendo todo sucesso numa pequena cidade no sul do país, em Tubarão, Santa Catarina. Alexia Rockr e Leona Barbecue nos contam como é ser drag queen numa cidade pequena, relatam suas histórias e se enfrentam preconceito quando aparecem montadas ao público.
GÊNERO OU SEXUALIDADE?
Embora muitos pensem que drag queen está ligado a sexualidade ou gênero, se trata de uma arte. Alexia explica que qualquer pessoa pode usufruir dessa arte e ser transformista. Seja homem gay ou hétero, mulher lésbica ou hétero, não tem preconceito, se trata especificamente em ser artista. É o caso da Drag Queen hetéro, Luís Otávio, empresário, casado e pai de família que leva a diversão da sua personagem para as animadas noites de Belo Horizonte.

ARTES ABRAÇAM A CULTURA DRAG QUEEN
O cenário musical Drag Queen no Brasil está sendo acolhido pela cultura artística, assim como os lgbtq+. Esse espaço é o fundamental para que as pessoas desenvolvam empatia a essa minoria que vem sofrendo calada por anos. Um grande passo para essa revolução aconteceu quando Pabllo Vittar ingressou na equipe no programa da globo, Amor e Sexo, apresentado por Fernanda Lima. Desde então, a crescente valorização de seu trabalho abriu portas para todo espetáculo colorido acontecer. Alexia Rockr e Leona Barbecue são dj’s nas badaladas noites de uma casa noturna que se consagrou dentro da cidade de Tubarão, onde moram. É onde trabalham, divulgam suas respectivas artes e se sentem acolhidas.
AINDA SOBRE VIOLÊNCIA
Doze das vítimas foram identificadas como heterossexuais, mas incluídas no relatório pelo envolvimento com o meio LGBT+, por tentarem defender algum LBGTQ+ quando ameaçados de morte, por estarem em espaços predominantemente gays ou serem amantes de travestis. Das centenas vítimas de homotransfobia registradas em 2017, 43,6% eram gays (194 mortes), 42,9% trans (191), 9,7% lésbicas (43), 2,7% heterossexuais (12) e 1,1% bissexuais (5), totalizando 445 mortes.
Inclusive o aumento de mortes de pessoas transexuais chamou atenção na pesquisa comparada com o ano anterior. As capitais de São Paulo, Minas Gerais, Bahia e Ceará despontam com os maiores índices de homofobia. O sul do país se registra nas pesquisas como o menos homofóbico comparado as outras regiões. No norte, principalmente entre o Pará e o Amazonas, a violência contra travestis e transexuais está tomando proporções avassaladoras. A pesquisa ainda relata que em menos de um quarto desses homicídios o criminoso foi identificado e menos de 10% das ocorrências redundaram em abertura de processo e punição dos assassinos.
O CENÁRIO NA MÍDIA
Seja em Hollywood ou até mesmo no Brasil, atorxs e cantorxs transexuais não estão em falta, mas sim o espaço para eles, são raramente vistos atuando onde a transexualidade é um ponto importante, e quase inexistentes em papeis ou palcos onde orientação sexual não é o centro do foco. Já do outro lado, é comum acompanhar atores heterossexuais interpretando mulheres trans, e o papel acabar rendendo uma indicação ao Oscar, como Eddie Redmayn que concorreu na categoria de melhor ator, em A Garota Dinamarquesa, e Jared Leto vencedor de melhor ator coadjuvante em 2014, no filme Clube de Compra Dallas.
Por muito tempo transexuais foram ligados a estereótipos marginais, sendo ligados em muitos casos como prostitutas, rejeitados pela família, escandalosos e criminosos, mas pouco a pouco o cenário melhora, no Brasil a TV fechada lida de maneira um pouco melhor com essas personagens, enquanto a TV aberta ainda trabalha a versão mais cômica, a cabeleireira estereotipada louca por brilho e salto alto. E é claro que não podemos deixar passar o exemplo maravilhoso de Sense8, uma série escrita pelas irmãs trans Wachowski, onde tanto a personagem é transexual quanto a atriz que a interpreta. Dentro da vida Drag Queen muitos comentários confundindo a arte com a sexualidade acontece...
Personagens homossexuais são representados desde muito tempo no cinema, a primeira vez que aconteceu foi em 1895, no filme intitulado “The Gay Brothers”, nome sugestivo e muito experimental. A partir de então a retratação do homem gay foi sempre cômica. A falta de seriedade com o assunto é avassaladora no cinema, a indiferença com o preconceito sofrido por pessoas estereotipadas é comum desde que a Igreja Católica tratou o assunto como profanação e pecado.
A representação do homossexual era quase sempre uma chacota, para satisfazer o ego machista e preconceituoso da população ou de uma forma errônea incluir o gay nas telas. Engana-se quem pensa que a arte de ser transformista começou recentemente, depois dos anos 70. Na Grécia Antiga só homens podiam atuar e dessa forma acabavam interpretando papeis femininos. A partir do séculos 18 esses atores começaram a ser motivo de chacota.
O preconceito levou a sociedade a incluir os lgbtq+ de uma forma desesperada e errônea nos filmes, por exemplo. As maiores representações trazem os personagens como vítimas, depressivos ou malvados. O tópico doença e drogas é gritante quando tramas são desenvolvidas exclusivamente para o público LGBT.
Na televisão isso vem mudando. A série norte-americana “Looking” é a prova de que atualmente os diretores estão deixando as críticas conservadoras de lado e abrangendo um público maior. A nova versão da famosa série norte-americana, Degrassi: The Next Class, não aborda o tema como algo errado, naturalmente por não ser um problema. Até quando vamos ver os homossexuais como alívio cômico do telespectador não sabemos. Porém, temos outros setores com o respiro que precisamos para ver que as coisas estão acontecendo. Na música grande parte da nova era de cantores é LGBTQ+ ou simpatizante com o público. A explosão das drags queen na música também mostra a crescente militância da causa no país mais homofóbico do mundo.
POR TRÁS DE ALEXIA
Marcelo Borges sempre foi uma criança arteira, gostava de brincar na rua e de fazer folia. Quando menor era reprimido pelos colegas do bairro onde morava por ser o menino mais alto e espoleta. Com o passar do tempo decidiu procurar novas amizades, encontrou a tribo dos emos/góticos e a partir de então sua paixão pelo lado "escuro" começou aparecer. Nunca precisou dizer para sua mãe que era gay, seu pai sempre foi ausente e isso não justifica sua opção sexual...
POR TRÁS DE LEONA
Higor Rosa era receoso ao que seu avô pudesse pensar da sua sexualidade. Mas foi na primeira tentativa que descobriu o amor que sua família proporcionava. Assim como Marcelo nunca teve problemas com seus familiares a respeito de sua sexualidade. A partir do momento em que seu avô e sua mãe aceitasse como veio ao mundo, então para ele nada mais importava...

Homofobia é uma série de atitudes e sentimentos negativos em relação a pessoas homossexuais, bissexuais e, em alguns casos, contra transgêneros e pessoas intersexuais.
Segundo a psicologa Marisa de Abreu, a psicologia tem o papel de esclarecer o que é orientação sexual iniciando até mesmo pelo que não é: homossexualidade não é opção, não é doença, não é uma ideia passageira, não é resultado de maus tratos, não é apego à mãe, etc. A fobia, e também a homofobia, vem da falta de conhecimento e compreensão do que seria homossexualidade.
Atualmente São Paulo é o centro dessa cultura cada vez maior. Os artisas que estão começando, buscam a cidade por ser a mais populosa do país. Esses transformistas não param de surgir; de um tempo para cá a explosão foi tão grande que não se tira mais os nomes de Gloria Groove, Pabllo Vittar, Lia Clark e Aretuza Lovi das mídias digitais, assim como da televisão, principalmente em canais fechados como Multishow. A aparição da imagem desses artistas é o ponto ideal para que as pessoas preconceituosas vejam que não há nada de errado em se vestir de mulher, é apenas um modo de se divertir, de encarar a vida, fantasiar e sair da rotina monótona. Drag Queen são pessoas que buscam levar o principalmente diversão e deixar debaixo da peruca toda insegurança que o mundo lhe causa.
Um texto de Roger Viana.
Apresentando, Alexia Rockr e Leona Barbecue.
Filmagens Luis Tavares.
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